terça-feira, novembro 25, 2008

Lágrimas no escuro

Até por volta de seus 15 anos, Adélia jamais tinha visto sua mãe chorar. Quando criança, achava que mãe não chorava mesmo, e que era algo normal. Até que, na segunda série, fez uma breve pesquisa entre seus colegas, que foram unânimes: sim, mãe chora também.

Pra falar a verdade, sua mãe sempre representou uma fortaleza inabalável. Nem a felicidade exacerbada, tampouco a tristeza, a afetavam profundamente. Era ela quem resolvia tudo, e pronto. Não podia se dar ao luxo de fraquejar.

Quando começou a entender melhor a vida, Adélia passou a encaixar os fatos. Sabia da infância difícil de sua mãe, tendo que dividir a atenção dos pais com seus 12 irmãos, começando cedo no trabalho na lavoura, e tudo o mais. Imaginou que, devido à criação, sua mãe tivesse construído um muro dentro de si, que impedia a entrada das emoções.
Já tinha ouvido falar de vários problemas resolvidos em divãs, e então resolveu propor à sua mãe uma terapia.

Meses se passaram, até que um dia, a mãe de Adélia chegou em casa com os olhos inchados, vermelhos, soluçava tal qual uma criança. Um pouco assustada, a menina correu para o quarto de seus pais para aguardá-la. Sabia que, naquela hora, a mãe iria procurar se afastar das pessoas. Não estava acostumada a se desequilibrar emocionalmente na frente de ninguém.

Mãe! O que foi? E a mãe aos prantos, sem saber o que dizer nem pra onde olhar. Se abraçaram. E o desabafo: filha, rompi uma barreira dentro de mim. Está doendo, mas me sinto mais leve!

A partir de então, a mãe de Adélia se tornou outra pessoa. Mais alegre, carinhosa, sensível. E se permitiu descobrir a dança. E a dança fez cócegas no seu coração, e ela passou a se apaixonar pela vida, a se gostar mais, a se sentir bonita de verdade.

Na volta de um grande encontro de dança no interior, chamou Adélia para contar as novidades. E ficaram horas papeando, rindo, como se tudo ao redor não tivesse a menor importância. Ao final da conversa, dentro da sua imensa humildade, a mãe agradeceu: filha, muito obrigada por me ouvir com tanto entusiasmo.

E foi a primeira vez que Adélia viu sua mãe chorar de alegria.

segunda-feira, novembro 17, 2008

O barquinho vai

Primeiro foram os apagões, que o deixavam desesperado durante tortuosos minutos até que recobrasse a visão. Aí veio o cateterismo, que resultou na cirurgia. Um sucesso, felizmente.

O clima no local já não era dos melhores - não vinha sendo, na verdade, nas últimas semanas ou até meses, quiçá anos. Os momentos bons e ruins se alternavam rapidamente, provocando uma confusão mental digna de quem adora se preocupar em excesso com as coisas.

As responsabilidades, paralelamente, aumentaram. E com elas, os problemas também. Falta de dedicação de algumas partes, dedicação exacerbada de outras... Nesse desequilíbrio, sofreram os mais sensíveis, sofrerão ainda, talvez, mas agora cientes de seu verdadeiro papel por ali. Mais maduros, a cada dia. Na marra.

Daí eu tirei férias de tudo isso e fui curtir dois dias infinitamente lindos e azuis na praia.